Quando “A mulher submersa” emite sua voz
- aaffortunatimartins
- 22 de mar. de 2022
- 1 min de leitura

quando escrevi a Mar Becker e disse que queria tocar suas palavras, fiquei com medo de redigir seu nome:
M A R
outro nome para o infinito,
outro nome para a densidade das matérias salinas,
outro nome para os movimentos revoltosos das águas, que nos afundam na espessura verde-esmeralda,
outro nome para a calmaria repetitiva das ondas noturnas, que embala o tempo sem saída,
outro nome para a conjunção vida e morte.
a verdade é que quando escrevi
M A R B E C K E R
já tinha encontrado o cheiro de suas palavras com a brisa que o carrega.
quando toquei com meus olhos as páginas de seu livro, senti penetrar em mim a distância dos silêncios, a ausência que não é vazia.
quando tateei com meus olhos as palavras de seus poemas, avistei nos buracos, vales e montanhas, intransponíveis.
um horizonte longínquo, inalcançável.
e na orelha de Micheliny Verunschk sussurrou Ofélia, a figura que me perturbava como mulher-morta.
uma MULHER SUBMERSA nunca está morta.
o sopro de suas letras é suave, mas o frêmito é indelével.
imprime marcas aquém da história.
o rumor de uma brisa sempre pode ser estrondoso – tudo depende dos silêncios que o acompanham.
quando a fragilidade crava sua força, embarcamos em outro tempo, outro espaço.
é penoso regressar depois do abalo.
as unhas fincam-se no chão, e a força arrasta o corpo no difícil retorno.
soerguê-lo é signo fatal do regresso.
***
nenhuma mulher submersa é sem voz.
em suas palavras feridas, murmúrios da morte e entonações da vida.
Mar Becker auscultou diminutos grãos de vida e morte.
em cada um deles concentrava-se todo o amor capaz de existir.
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